Os perigos da avaliação de desempenho nas organizações
E porque não usar a famosa Nine-Box
[Texto de 24/fevereiro/2021]
Avaliação de desempenho (ou performance) é uma ferramenta muito [mal] utilizada nas organizações.
Para poder explorar o assunto irei percorrer os seguintes tópicos:
Objetivos de uma avaliação de desempenho
Perigos
Nine Box: não caia na armadilha
🧩 Sugestões de alternativas para cada tipo de objetivo
Objetivos de uma avaliação de desempenho
Enxergo alguns possíveis objetivos para a uma avaliação de desempenho:
🏄 Desenvolver habilidades
Avaliar o nível de habilidades atuais e o que falta para chegar a outro nível
Mentorar
🪞Reconhecimento e avaliação de parceria
Novos papéis, mais responsabilidades e mais participação em decisões
Salário
Bônus
Promoção
Oferta de Stock Options
Alteração de papéis conforme melhor combinação de habilidades
Encerramento de parceria
📈 Sustentar performance
Impulsionar desempenho para alta performance
Perigos
Competências: estado que se altera ou traço de personalidade?
Antes de criar uma avaliação, é importante saber se você está tentando medir um estado ou um traço de personalidade, para saber o melhor método a utilizar.
Um estado é algo que varia ao longo do tempo. Exemplo: emoção, habilidade ou conhecimento.
Porém, traços de personalidade podem ter padrões mais estáveis. Exemplo: pessoas mais introvertidas x pessoas mais extrovertidas.
Uma simples avaliação de competências não faz sentido para esse segundo grupo. Para isso, utilizam-se testes de personalidade onde a pessoa faz uma auto-avaliação em cima de frases cuidadosamente elaboradas ou testes de julgamento situacional. E ainda assim é questionável.
Se queremos medir algo abstrato como “pensamento estratégico” ou “foco no cliente” precisamos definir se isso é um estado ou um traço.
Marcus Buckingham e Ashley Goodall exploram em detalhes esse assunto no livro Nine Lies About Work: A Freethinking Leader’s Guide to the Real World¹.
De acordo com eles, se for um estado, então deveríamos fazer uma pesquisa perguntando o estado mental da pessoa sobre tal coisa ou fazer um teste que possua respostas corretas e incorretas. Não deveríamos deixar um gerente ou par avaliar a pessoa nisso porque eles não podem saber quanto dessa qualidade abstrata ela possui, mais do que eles podem adivinhar com precisão suas preferências de voto ou a pontuação que ela obteria em um teste.
A verdade sobre competências como pensamento estratégico, foco no cliente, orientação a objetivos e outras é que elas são uma mistura aleatória de estados e traços. Não sabemos se deriva da maneira como seu cérebro foi programado, ou pelo que você aprendeu a fazer, ou de algo que você foi dito para fazer. Não sabemos se é uma habilidade diferente que você aprendeu, ou a mesma habilidade usada de forma diferente, ou algo totalmente diferente.
A pesquisa sobre alta performance em qualquer profissão ou empreendimento revela que a excelência é idiossincrática. Pessoas de alto desempenho completas em todos os aspectos é uma criatura do mundo da teoria. No mundo real, cada artista de alto desempenho é único e distinto, e se destaca precisamente porque essa pessoa entendeu sua singularidade e cultivou isso de forma inteligente.
Para apimentar o assunto, os autores continuam dizendo que devido às competências serem imensuráveis, é impossível provar ou refutar a afirmação de que (1) todos que se destacam em um determinado trabalho possuem um determinado conjunto de competências. E é igualmente impossível mostrar que (2) as pessoas que adquiriram as competências que faltavam, superaram aquelas que não —ou, que, em outras palavras, pessoas completas são melhores.
Essas duas afirmações juntas são a base para a maioria do que as empresas fazem para desenvolver os talentos das pessoas, mas elas não possuem suporte científico:
você não encontrará artigos acadêmicos em qualquer periódico revisado por pares comprovando a necessidade de possuir certas competências.
e, nenhuma prova de que adquirindo as competências que falta a você te dará qualquer aumento no desempenho.
Aprendizado pessoal
Aqui eu quero fazer uma pausa para compartilhar e admitir meus tropeços.
Alguns anos atrás, na pressão do tempo para apoiar a construção de trilhas de progressão para várias especialidades eu acabei aceitando “recheá-las” com listas de competências, caindo na armadilha que acabei de falar acima.
Essa questão já me trazia incômodo, porém eu não tive força, tempo e ânimo para fazer algo diferente influenciado pelas expectativas que estavam rolando com isso.
Fui indicado algumas vezes a copiar e colar o que outros RH já faziam. E imagino que a intenção era boa: “vamos perder menos tempo reinventando o que ‘já funciona’ nas empresas que estão crescendo com sucesso”. Vem aquela ideia de que “há muita coisa a se fazer, se questionarmos as coisas mais básicas, não vamos avançar na velocidade que desejamos.”
Curiosamente, ao conversar com RHs de algumas empresas para saber como estava “funcionando” trilhas de progressão e avaliações por lá, senti o cheiro dos perigos e armadilhas que descrevo nesse texto.
Vivendo e aprendendo.
Dificuldade em avaliar pessoas que trabalham com conhecimento e colaboração em grupo
Em nosso contexto atual do mundo é comum pessoas que trabalhem com conhecimento e questões complexas onde é necessária colaboração em grupo em várias partes de uma entrega:
É inviável medir performance individual por quantidade do que é entregue por hora ou dia.
Entregas são intangíveis e difíceis de definir.
Resultados são frequentemente baseados em entregas de times em vez de individuais.
O tempo gasto em trabalho está cada vez mais confuso à medida que o trabalho distribuído e remoto integra o trabalho e afazeres pessoais.
Nossa avaliação é, e deveria ser, subjetiva
Temos que aceitar que nem tudo pode ser medido de forma objetiva. Marcus e Ashley, dizem que nós temos uma tendência em pensar que subjetividade nos dados é um “bug” (erro ou falha), e que por isso o recurso que estamos buscando é objetividade. Porém, na verdade, quando se trata de medição, a busca por objetividade é o bug, e a subjetividade é a característica confiável.
Para ir além, de acordo com o consultor de cultura organizacional, Edgar Schein, mesmo numa relação de consultoria devemos avaliar uma relação desde o início e a todo momento de forma subjetiva. Ele não acredita que tudo deva ser uma medição numérica. O que ele utiliza para o próprio trabalho é a todo momento perguntar ao cliente se a relação está funcionando, se estão se conectando². Direto ao ponto.
Perigos e armadilha: quais tipos de dados precisamos para uma avaliação?
Quando você decide fazer uma avaliação é preciso saber quais qualidades busca nos dados: confiáveis, variados e válidos.
📊 Dados confiáveis
Boa parte dos dados que utilizamos não são confiáveis. E para explicar isso, explorarei alguns efeitos e vieses.
Efeito idiossincrático
Esse efeito explica que minha avaliação sobre você, como por exemplo seu “potencial”, é guiada não por quem você é, mas em como eu definiria “potencial”, quanto disso eu penso que eu tenho, o quão duro costumo avaliar outros. É mais sobre mim do que sobre você.
Somos consistentementes duros ou generosos.
Em três estudos conduzidos entre 1998 e 2010, gerentes, pares e subordinados eram perguntados para classificar a performance de seus colegas. Na média, mais que 60% da variação nas classificações poderiam ser rastreadas para o estilo de avaliação do próprio avaliador. Isso torna avaliações individuais altamente não confiáveis.³
Avaliamos melhor aqueles que são mais parecidos conosco
Outro aspecto desafiador é o favoritismo intragrupal, conhecido também como viés de grupo. Nós tendemos a avaliar melhor aqueles que são mais parecidos culturalmente conosco.
É comum dividirmos o mundo entre nós e eles, nós e os outros. Pessoas da esquerda política, pessoas da direita. Evangélicos, católicos.
Mesmo estando conscientes de alguns vieses, ainda assim é difícil separar a questão de “quem é competente?” da questão de “quem faz me sentir mais confortável?” ou “quem se parece mais comigo?”.
O que acreditamos ser meritocracia pode ser melhor descrito como “espelho-tocracia”⁴, termo sugerido por Mitch Kapor. Tendemos a contratar pessoas como nós mesmos, em vez de contratar as melhores pessoas para o trabalho.
Efeito Halo
Temos uma tendência a usar nossas primeiras impressões sobre uma pessoa para outros fatores não relacionados, interferindo em nosso julgamento. Até mesmo nossa simpatia com alguém pode afetar nossa avaliação.
Nossas impressões são resistentes à mudança, mesmo diante de novos dados.
O pesquisador David Schoorman fez um estudo⁵ para validar as seguintes hipóteses:
(a) os supervisores que participam de uma decisão de contratação ou promoção e concordam com a eventual decisão distorceriam positivamente as classificações de avaliação de desempenho subsequentes para aquele funcionário
(b) os supervisores que participam da decisão original, mas discordam com a decisão enviesaria as classificações de avaliação de desempenho subsequentes em uma direção negativa.
Os dados forneceram um forte suporte para ambas as hipóteses, demonstrando vieses de escalonamento positivos e negativos.
Efeito Dunning-Kruger e Efeito melhor que a média
O efeito Dunning-Kruger é um fenômeno que leva indivíduos que possuem pouco conhecimento sobre um assunto a acreditarem saber mais que outros mais bem preparados, fazendo com que tomem decisões erradas e cheguem a resultados indevidos; é a sua incompetência que restringe sua capacidade de reconhecer os próprios erros⁶. Estas pessoas sofrem de superioridade ilusória.
Isso não significa que são pessoas ignorantes, porém diz que elas possam achar que sabem mais do que realmente sabem.
No livro Humanocracy⁷, os autores Gary Hamel e Michele Zanini dizem que embora a inclinação para o autoengrandecimento seja universal, é particularmente pronunciada no topo:
Pessoas altamente confiantes tendem a ter uma vantagem na competição pelo poder. Quanto mais confiante alguém parece, mais provável é que acreditemos que eles são genuinamente capazes, seja isso verdade ou não. A competência genuína muitas vezes é difícil de avaliar, então, em vez disso medimos a autoconfiança de um indivíduo.
Em uma hierarquia formal, as relações de poder são altamente assimétricas. Os gerentes têm muito mais controle sobre seus subordinados do que o contrário. Isso torna arriscado questionar a competência de um superior. Enfie um alfinete no ego exagerado de seu chefe e é sua carreira que irá “estourar!” Diferenciais de poder incentivam a aquiescência, que os líderes frequentemente confundem com acordo.
Há uma terceira razão pela qual hierarquia promulga suposições irreias sobre competência executiva. Entre aqueles que aderem uma visão top-down de autoridade, há uma crença comum que “grandes” questões são exclusividade de “grandes líderes”. Embora os líderes seniores em sua empresa possam ser, em última análise, responsáveis pela estratégia, isso não quer dizer que eles são os melhores para criá-la.
Síndrome do impostor e Efeito pior que a média
Síndrome do impostor é quase que o inverso do efeito Dunning-Kruger. Ambos, Dunning e Kruger, parecem ter suposto que uma pessoa competente poderia subestimar seu nível de competência. Mas, na síndrome do impostor, uma pessoa competente sente como se fosse uma fraude e provavelmente será descoberta a qualquer momento.⁸
Isso faz com que pessoas competentes possam se auto-avaliar de forma a subestimar suas competências. Além disso, uma pessoa sofrendo dessa síndrome pode se questionar com outras colegas e até com sua chefe, podendo potencializar que as pessoas possam avaliá-la com menor competência pela própria insegurança e questionamentos consigo.
Efeitos corrosivos
Gary e Michele dizem⁷ que os efeitos corrosivos desses preconceitos são exagerados pelo fato de que os julgamentos sobre a competência de um indivíduo são muitas vezes dependentes das opiniões de um único avaliador — o chefe do funcionário.
Em uma pesquisa conduzida pelo consultor John Gardner, mais de trezentos executivos foram questionados sobre a prevalência do favoritismo nas decisões promocionais. Para os fins do estudo, favoritismo foi definido como “tratamento preferencial com base em fatores não relacionados às habilidades de uma pessoa, como histórico, ideologia ou instintos viscerais.”
O estudo de Gardner revelou⁹:
Setenta e cinco por cento dos executivos testemunharam favoritismo nas decisões de contratação.
Noventa e quatro por cento acreditavam que as políticas destinadas a prevenir o favoritismo eram ineficazes.
Oitenta e três por cento disseram que o favoritismo produziu más decisões de promoção de qualidade.
📊 Dados variados
Marcus e Ashley¹ dizem que dados variados são dados que mostram uma variação natural (não forçada); um intervalo que reflete um intervalo no mundo real.
Se, por exemplo, você pedir para pessoas avaliarem um treinamento, você provavelmente perceberá que a ferramenta de medida produzirá dados com pouca variação. Peça para os participantes responderem “De forma geral, foi uma boa experiência de aprendizado” numa escala de 5 pontos, com 5 sendo “concordo totalmente” e 1 sendo “discordo totalmente”, e você perceberá que quase todas as respostas serão 4 ou 5.
Ferramentas de avaliação de performance são igualmente mal desenhadas. Líderes raramente usarão os dois primeiros pontos (1 e 2). De acordo com esses autores¹, é por isso que tantas empresas sentem a necessidade de forçar a curva — se não o fizessem, a ferramenta de avaliação de desempenho simplesmente não produziria dados com variação.
Para produzir essa variação em nossas ferramentas, eles dizem que nós temos que criar questões que contenham palavras extremas.
Questões como “Eu sinto meu trabalho combina com minhas habilidades” produz pouca variação. As pessoas concordarão ou discordarão fortemente.
Um exemplo de adaptação de palavras para gerar variação poderia ser “Eu tenho a chance de usar minhas forças todos os dias no trabalho”.
As palavras “todos os dias” é extrema, e seu efeito é empurrar as pessoas para respostas mais variadas.
📊 Dados válidos
Os dados podem ser interpretados como válidos se o intervalo de dados produzidos pela ferramenta podem provar repetidamente que está medindo algo que tem correlação ou prediz um resultado diferente usando uma ferramenta diferente.
Uma nota alta na ferramenta de avaliação de performance prediz uma alta nota em algo mais no mundo real? A variação na ferramenta e relacionada a uma variação em algo mais no mundo real?
Podemos dizer que os dados de uma ferramenta de engajamento são válidos se as pessoas que avaliam seu engajamento de forma mais positiva na ferramenta, na verdade, acaba ficando com a empresa por mais tempo — neste caso, o intervalo nas pontuações de engajamento prevê um intervalo subsequente na rotatividade voluntária.
📈 Conclusão sobre dados confiáveis, variados e válidos
Dados confiáveis, variados e válidos são sinais de bons dados e esses três conceitos ajudarão você examinar a qualidade de qualquer dado.¹
Uma dica que os autores Marcus e Ashley nos dão é: comece por dados confiáveis.
Nine Box: não caia na armadilha
Nine box é uma ferramenta muito utilizada — copiada — pelas organizações. Afinal, virou algo quase padrão e, assim, muitas acreditam que seja algo necessário e importante.
Não posso dizer que é apenas uma ferramenta mal utilizada, mas mal desenhada. Por mais que nos esforcemos, ela não tornará as informações objetivas e nem livre dos preconceitos.
Porém, ela pode ser útil se o desejo da organização é confirmar vieses de chefes e justificar o injustificável.
A função dessa ferramenta é avaliar os colaboradores em duas dimensões:
performance no passado
potencial futuro
Performance no passado
Percebo algumas formas de avaliação no eixo de performance da Nine-Box: (1) por competências ou (2) por metas e resultados.
Se você leu até aqui talvez já consiga perceber as armadilhas do Nine Box em ambos pontos.
Potencial futuro
Os autores do livro Nine Lies About Work¹ possuem um capítulo exclusivo, chamado Mentira #7, para tratar essa questão. Eles dizem que acreditar que “as pessoas têm potencial” e avaliar isto vem do desejo de controle das organizações, e sua impaciência com as diferenças individuais, buscando identificar rapidamente as pessoas que podem investir seus recursos finitos. Um primeiro problema é saber definir o que seria potencial. Você pode descobrir várias definições.
Se você acreditar que potencial está ligado a um traço da pessoa, você cai no problema que descrevi mais no início do texto onde abordo estados vs traços de personalidade. Porém, no caso de potencial, o desafio é em ordem de magnitude muito acima, uma vez que estamos pedindo ao avaliador para avaliar você não em uma característica exibida em seu comportamento atual, mas em uma projeção, uma probabilidade de que você possui algo que pode ser exibido em alguma situação futura. De acordo com Marcus e Ashley, é totalmente impossível para o avaliador fazer isso de forma confiável, então os dados que ele produz sobre você serão o pior tipo de dado.
Ainda, de acordo com eles, a evidência da existência de potencial geral é inexistente. Em vez disso, as evidências apontam exatamente na direção oposta. Sabemos que o cérebro de cada pessoa cresce adicionando mais conexões sinápticas, que o padrão sináptico de cada pessoa é único e, portanto, o cérebro de cada pessoa cresce de maneira única. Portanto, sabemos:
que a capacidade de aprender existe em todos nós,
se mostra de forma diferente em cada um de nós, e
embora possamos melhorar em qualquer coisa, nenhum de nós jamais será capaz de religar nossos cérebros para se destacar em tudo.
De forma mais simples, todos nós podemos melhorar, e todos nós iremos melhorar em coisas diferentes, de maneiras diferentes e em velocidades diferentes.
Nas palavras de Marcus e Ashley:
Vai incomodá-lo muito saber, então, que no mundo real, nada disso funciona. Nenhum dos mecanismos e reuniões — nem os modelos, nem as sessões de consenso, nem as competências exaustivas, nem as escalas de classificação cuidadosamente calibradas — nenhum deles vai garantir que a verdade sobre você apareça na sala, porque todos eles são baseados em a crença de que as pessoas podem avaliar outras pessoas de forma confiável. E elas não podem.
Curva forçada
Este é um processo de reconciliar a necessidade da organização de ter apenas uma certa porcentagem de pessoas aparecendo com desempenho super alto devido à tendência dos líderes evitarem classificações baixas no desempenho das pessoas, a fim de evitar conversas desagradáveis sobre desempenho com elas. Afinal, uma outra parte difícil é jogada em cada líder ao ter que omitir, desconversar ou tentar justificar sua avaliação na curva forçada dentro da Nine-Box.
Calibração
Depois de um gestor avaliar alguém, em geral, há um ritual de “calibração”, onde vários diretores e gestores se reúnem para integrarem outras perspectivas. Há uma crença de que esse ritual tornará dados sem qualidade em dados com qualidade. Curiosamente há uma outra crença de que pessoas da camada de cima da hierarquia serão mais apuradas em saber sobre o que avaliam, sendo que talvez sejam as pessoas menos próximas do contexto para observar o trabalho das pessoas.
Frequência: uma ou duas vezes por ano
Essa frequência torna os dados ainda menos úteis. Lembraremos dos comportamentos exibidos e projetos que a pessoa estava envolvida durante todo o ano ou semestre? Ou será que usaremos dados do último mês ou algo que nos marcou apenas? Além de vieses de disponibilidade, de representatividade e de confirmação, vale lembrar da “regra do pico-fim” (em inglês, “The Peak-End Rule”): os momentos positivos ou negativos mais intensos (os “picos”) e os momentos finais de uma experiência (o “fim”) têm um grande peso em nosso cálculo mental, podendo mascarar ou omitir outros momentos.
🧩 Sugestões de alternativas
Você pode estar se perguntando: e agora, o que faço então? Abaixo listo algumas alternativas, mas não as únicas, para você experimentar de acordo com seu objetivo e ver se trouxe os benefícios esperados, sem prejuízos desnecessários.
Não crie ferramentas complicadas para resolver algo complexo. Pelo contrário, utilize ferramentas simples pois poderão ser fáceis de aplicar, manter e ajustar caso não se mostre efetiva. Além disso, se tornam mais simples de compreender.
Ferramentas complicadas por vezes mascaram falhas, incentivando as pessoas acreditarem que a complicação é sinal de qualidade ou precisão.
🏄 Desenvolver habilidades
Quanto mais sua estrutura organizacional criar oportunidades nas quais as pessoas possam se aventurar para aprender e experimentar voluntariamente, mais elas poderão se engajar e se responsabilizar pelo próprio desenvolvimento. Adapte o sistema, não as pessoas.
Mentoria entre pares e Comunidade de prática
Habilite uma plataforma na qual as pessoas possam mostrar interesse comum e potencialize discussões e aprendizados por lá. Como aditivo, pesquise por Working Out Loud ou Action-Learning.
Crie condições para as pessoas se conectarem e aprenderem entre si. Torne visíveis as habilidades e interesses das pessoas da organização. Estimule que busquem aconselhamento e aprendam entre si.
Mentoria e treinamento externo
Explore a alternativa de disponibilizar um valor mensal para contratar hora de mentoras externas ou treinamentos conforme desejo da própria pessoa e não algo obrigatório.
Grupo de pessoas treinadoras
Tenha algumas pessoas em um papel de treinadora técnica e crie um grupo com essas pessoas.
A principal responsabilidade deste papel poderia ser apoiar as pessoas em uma trilha de desenvolvimento técnico (ex: frontend; ux; etc) e aconselhar decisões difíceis sobre sua área quando consultada.
Esse papel não teria autoridade unilateral para contratar ou demitir.
Essas pessoas poderiam energizar também outros papéis na organização.
Trilhas de progressão
Com trilhas de progressão informando quais possíveis próximas etapas, as pessoas podem ter um norte de como avançar em caminhos que se interesse.
Gamificação com trilha de progressão
Utilize gamificação para estimular o desenvolvimento e reconhecer níveis em uma trilha de progressão. As pessoas poderiam aplicar para subir de nível na trilha enviando evidências que comprovem sua participação em algo prático que fez uso de habilidades deste nível.
Cada nível poderia exigir não só evidências de trabalho mas também uma permanência mínima no nível antes de aplicar para o próximo.
Você poderia criar medalhas relacionadas a cada nível e também outras que reconheçam habilidades que independem de alguma trilha de progressão.
As medalhas poderiam ter um tempo de validade, incentivando uma atualização e comprovação de que a pessoa continua utilizando suas habilidades nos projetos da organização.
Uma pergunta pode surgir: quem avalia as aplicações para ganhar medalhas ou subir de nível?
Sugestão: tenha um papel separado que tenha por responsabilidade fazer essa avaliação. Em geral, uma pessoa escolhida pela liderança ou por um grupo que tenha experiência no contexto da medalha para avaliar as evidências de alguém que deseja conquistar essa medalha.
Avaliação subjetiva sobre o desempenho da pessoa em determinados papéis
Se você utiliza uma Tecnologia Social como O2 (Organização Orgânica), sabe que possivelmente uma pessoa pode energizar mais de um papel.
A qualquer momento ou em um momento pré-determinado após a atribuição da pessoa a algum papel, ela pode pedir para ser avaliada nesse papel.
O que é esperado:
convidar pessoas com quem mais tem relação nesse papel
informar em qual papel deseja ser avaliada e consultar quais papéis as pessoas desejam avaliar sua atuação
Abaixo está um exemplo de uma possível dinâmica de avaliação.
Estágio de entendimento
A pessoa compartilha com as demais, seus papéis e responsabilidades que serão avaliados.
Uma rodada é feita com as perguntas abaixo, começando pela auto-avaliação da pessoa que deseja avaliação e depois pelas outras pessoas:
o que tem feito bem?
o que pode melhorar?
Estágio de exploração
Dado o que foi apresentado no estágio de entendimento, descubra temas e aspectos que respondam à pergunta: quais áreas para melhoria você enxerga? As pessoas presentes respondem.
Pode ser algo que a pessoa já esteja fazendo bem, mas deseja focar mais.
Estágio de brainstorming de ações
Agora, todas juntas podem fazer um brainstorming de ações para melhoria nas áreas listadas.
Como as pessoas gostariam de ver melhorias nessas áreas? Torne isso específico e factível.
Isso não é uma avaliação forçada em algum nível ou número. É uma exploração para ajudar a pessoa decidir o que ela deseja como plano próprio de ação no passo seguinte.
Estágio de criação de plano de ação
Agora, a pessoa que está sendo avaliada, cria uma proposta de plano de ação com as ações que explorou no passo anterior. Ela pode pedir ajuda a uma pessoa que tenha experiência nesses papéis ou alguém que ela confia.
Esse plano pode ser criado durante ou após a dinâmica.
Estágio de decisão
Alternativas nesse estágio:
A própria pessoa pode decidir pelo seu próprio plano de ação.
Decidir em consentimento com o grupo em que a pessoa trabalha.
Decidir em consentimento com um mentor.
Assim que é decidido, o plano de ação entra em vigor e um novo ciclo se inicia.
No próximo ciclo de avaliação, a pessoa pode compartilhar seu último plano de ação e explorar que conseguiu aplicar dele.
Novos projetos ou novos papéis
Estruture um sistema organizacional que permita as pessoas atuarem em novos projetos ou novos papéis que permitam elas desenvolverem habilidades e competências.
Experimentação
Estimule as pessoas tomarem risco, experimentarem, aprenderem e compartilharem seus aprendizados.
Se em sua organização há cargos de chefia/gerência/liderança que concentram poder sobre outras pessoas, inicie por essas pessoas compartilhando sues próprios casos de falhas e aprendizados, e praticando vulnerabilidade.
Se uma falha dentro de limites definidos levantar reações de culpa, vergonha ou ameaça em direção à pessoa envolvida na falha, pouco desses experimentos de aprendizado e desenvolvimento funcionarão, além da inovação ser comprometida.
Auto-reflexão
(inspirado nesse exercício e no texto The Six Sources of Influence on Human Behaviour)
Compartilhe a proposta abaixo com as pessoas.
Pessoal <> Motivação: O que você quer fazer e como deseja se sentir ou evitar se sentir?
Pessoal <> Recursos: Quais habilidades e conhecimento possui para isso?
Pessoal <> Confiança: Você se acha pronta para isso?
Social <> Motivação: O que as pessoas ao redor querem de você ou que impressão você quer causar?
Social <> Recursos: Como as pessoas ao seu redor podem te ajudar?
Social <> Confiança: Você acha que as pessoas irão te ajudar? As pessoas acham que você está pronta para isso?
Estrutural <> Motivação: Como isso é incentivado, recompensado ou reconhecido?
Estrutural <> Recursos: O que pode facilitar ou dificultar atualmente?
Estrutural <> Confiança: O sistema está adaptado para apoiar isso?
🪞Reconhecimento e avaliação de parceria
Avaliar sua própria percepção
Utilizando as dicas sobre dados confiáveis, variados e válidos, em vez de usar afirmações que pedem para avaliar comportamento dos outros, substitua por afirmações que perguntem à pessoa avaliadora sobre sua própria percepção em relação a algo sobre outra pessoa.¹⁰
Em vez da afirmação sobre uma outra pessoa como “É uma boa ouvinte”, substitua por algo que faça uma pessoa que irá avaliar a outra pensar na sua própria percepção: “Eu percebo que minhas opiniões são sempre ouvidas” com relação a outra pessoa.
Se você não deseja determinar questões específicas relacionadas a alguma percepção de característica/competência, no livro Nine Lies¹ os autores propõem uma avaliação de apenas 4 perguntas:
Você sempre recontrataria esta pessoa para a companhia. (1–5)
Você sempre escolheria esta pessoa para trabalhar junto a você. (1–5)
Você promoveria esta pessoa hoje? (Sim ou Não)
Esta pessoa tem um problema de desempenho que você quer tratar hoje? (Sim ou Não)
Outras variações dessas perguntas poderiam ser:
Dado o que eu sei sobre o desempenho da pessoa, e se fosse meu dinheiro, eu recompensaria esta pessoa com a remuneração e bônus possível mais altos em sua faixa. (1–5)
Dado o que eu sei sobre o desempenho da pessoa, eu sempre escolheria ela para trabalhar comigo. (1–5)
Esta pessoa está sob risco de baixo desempenho neste momento? (Sim ou Não)
Esta pessoa está pronta para uma promoção hoje? (Sim ou Não)
Esses tipos de questões geram dados confiáveis (e subjetivos, como desejado), e enquanto não são tudo, já é muita coisa. A interpretação desses dados precisa levar isso em conta. Não estamos avaliando objetivamente o desempenho e potencial, e sim coletando julgamentos subjetivos.
Veja o artigo Reinventing Performance Management para ver possibilidades de como utilizar e analisar os dados obtidos através dessas perguntas.
Grupo para avaliar situação de parceria entre pessoas colaboradoras
Para decisões críticas como demissões, ou mesmo salário, sua organização pode ter um círculo para tomar essas decisões de forma transparente. Veja mais sobre Círculo de Parceiros no blog da Target Teal.
📈 Sustentar performance
Avaliação de 8 aspectos correlacionados ao desempenho de um grupo
Na década de 1990 a Gallup fez um trabalho pioneiro sobre engajamento, identificando 12 condições como condutoras. Após isso outros trabalhos foram feitos em cima dessa pesquisa, sabendo que como todas as pesquisas sólidas, os resultados da pesquisa são provisórios, e no fim uma outra pesquisa¹¹ ¹² identificou apenas 8 aspectos com palavras redigidas precisamente que preveem validamente o desempenho sustentado de um grupo de pessoas trabalhando com o mesmo propósito.
Sustente um sistema que potencialize engajamento e assim provavelmente permitirá um bom desempenho das pessoas em seus papéis.
Abaixo fiz uma tradução livre das declarações em inglês (veja o original aqui):
(Propósito) Estou realmente entusiasmado com a missão da minha empresa.
(Excelência) Na minha equipe, estou cercado por pessoas que compartilham meus valores.
(Suporte) Minhas colegas de equipe me protegem.
(Futuro) Tenho muita confiança no futuro da minha empresa.
(Propósito) No trabalho, eu entendo explicitamente o que é esperado de mim.
(Excelência) Tenho a chance de usar minhas forças todos os dias no trabalho.
(Suporte) Eu sei que serei reconhecida por um excelente trabalho.
(Futuro) No meu trabalho, sempre sou desafiada a crescer.
Veja mais
Quer ler sobre outros perigos nas organizações? Veja esse texto sobre metas:
Referências
Nine Lies About Work: A Freethinking Leader’s Guide to the Real World
Humble Leadership | Edgar Schein | Talks at Google: entre os minutos 42 e 45
Marcus Buckingham, “Most HR Data Is Bad Data,” Harvard Business Review, February 9, 2015
F. David Schoorman, “Escalation Bias in Performance Appraisals: An Unintended Consequence of Supervisor Participation in Hiring Decisions” Journal of Applied Psychology 73, no. 1 (1988): 58–62.
Humanocracy: Creating Organizations as Amazing as the People Inside Them Hardcover
Kathryn Tyler, “Undeserved Promotions,” HR Magazine 57, no. 6 (junho de 2012): 79.
The Fatal Flaw with 360 Surveys — Marcus Buckingham, October 17, 2011
12 Research-backed Questions to Ask Your Team —Anil Karamchandani, February 2, 2020
Engagement Pulse: Team Leader Effectiveness Through the Eyes of Employees